Eva de Jesus, o fazimento da farinha

Manhã de agosto, São Gonçalo do Rio das Pedras.
Uma e outras nuvens sustentavam
o céu do Espinhaço.

Como um convite provindo da ancestralidade
Dona Eva havia me dito que aquele seria
um dos dias de fazimento da farinha.

_ Eu aprendi fazer farinha com minha mãe, pai.
A gente já começava desde novo, com uns 10, 12 ano.
A mãe já punha, ali, pra lavar mandioca, penerá a massa, rapar...
Só torrar que não torrava porque a gente era novo, né,
não tinha força, mas as coisa leve a gente fazia tudo.
Eu como era mais nova, mãe poupava muito...

Os braços fortes, a fumaça e o pó de mandioca
crestavam de suor o seu rosto
- semblante de traços distintos -
resplandecendo ajardinado SER.

_ O serviço não maltrata ninguém, dá é saúde.

Sentenciou em algum momento.

_ Pai morreu, Lori, sem saber o qu'era médico.
Com mais de oitenta ano trabalhando,
plantando, colhendo...

_ O nome dele?
Galdino Julio Madalena dos Passos
e da mãe, Georgina Correia de Aguiar.

Ela era parteira, benzedeira.
Caminhava distâncias longe pra poder ajudar uma pessoa
com os préstimos, com as oração, com os benzimento.
Não media esforço.

As lembranças narradas com entusiasmo
fizeram emergir o cheiro de um território
de cores e texturas sólidas e efêmeras
e a presença, quase, palpável
dos seus familiares e antepassados.

_ Naquele tempo, farinha fazia era mês inteiro,
Tinha um quarto, lá, que vivia lotado até encima de farinha.
Um caixotão, era quatorze alqueires de farinha que enchia ele.
Quinquinho, falecido Bastião, meu irmão,
puxava farinha a semana toda pra ele.
Ia dois alqueires e uma quarta cada burro.
E era porque a gente vivia era dela, né!?

Garimpo uma hora dava, outra hora não dava...

Enquanto a contemplava no monitor da minha câmara
o desconforto em perceber, como outras vezes me ocorreu,
e não era diferente naquele momento,
que as suas lições e a sua fé
foram extraídas da própria dor
do mergulhar bateias nos leitos dos rios,
do escumar melado nas tachadas de rapaduras,
do erguer enxadas e foices nas plantações
a se repetirem como uma história antiga.

_ Tudo qu’eu faço eu ponho Deus no meio.
Ele é que vai na frente...
Eu vou covar, eu já vou pedindo Deus, ó, tô covando,
vou plantar, Senhor me bençoa d’eu ser feliz com minhas planta
e me dá saúde e paz pra mim colher e comer, né!?

Em tudo eu ponho Deus, eu vou pegando no forno,
eu vou fazendo a cruz no forno, benzendo...

Uma atmosfera sagrada pairava
sobre Dona Eva e o ambiente.

SENHORA, ela se deixava fotografar.

EVA DE JESUS, uma RAINHA!!!

Lori Figueiró